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20,90 €Sobre Maria, essa Maria que Mazé Torquato Chotil resgata, o poeta Carlos Drummond de Andrade escreveu: "Tua voz, D\'Apparecida, é aparição/ Fulgurante, sensitiva, dramática/ e vem do fundo negroluminoso de nossos corações".
Negroluminosa voz a de Maria d\'Apparecida (1926-2017), que arrebatou os palcos mais disputados da música lÃrica europeia antes de alcançar o do Rio de Janeiro. Em 1965, quando Maria Callas não pôde cantar Carmen, a mezzo-soprano negra brasileira a substituiu. Só integrando, como estrela, uma companhia de prestÃgio europeia foi chamada a cantar no Theatro Municipal.
Nem por isso deixou de enfrentar o racismo, expresso agora não como veto, mas com pequenos gestos de um cotidiano cruel, como a recusa em massageá-la ou em aplicarem-lhe uma medicação.
Por quase uma década após esse momento de glória, D\'Apparecida circulou nos meios mundiais do canto com grande destaque. Um acidente interrompeu sua carreira lÃrica e a colocou na posição de cantora de Música Popular Brasileira e autora de um disco com Baden Powell. Foi quando mais vendeu LPs.
Maria d\'Apparecida foi também a musa de um grande pintor, o surrealista Félix Labisse, com quem manteve um longo relacionamento amoroso. Era amiga da esposa de Labisse, que se lembrou dela no testamento. Se tudo correr bem, estarão um dia os três na mesma tumba.
Filha de uma empregada doméstica engravidada pelo patrão, Maria d\'Apparecida nos faz lembrar das crueldades de classe e de raça sobre as quais se assenta a sociedade brasileira. Suas conquistas se deram superando essa injustiça estrutural, e lembrá-las é uma forma ao mesmo tempo de reconhecer seu talento gigantesco e de denunciar nossas raÃzes mais venenosas.
Sobre a autora: Mazé Torquato Chotil é jornalista, pesquisadora e doutora em ciência da informação e da comunicação pela Universidade de Paris VIII. Nascida em Glória de Dourados (MS), vive em Paris desde 1985. É autora de José Ibrahim: o lÃder da primeira grande greve que afrontou a ditadura, Trabalhadores exilados: a saga de brasileiros forçados a partir (1964-1985), Lembranças do sitio, Lembranças da Vila, Minha aventura na colonização do Oeste e Minha Paris brasileira. Em lÃngua francesa é autora de L\'Exil ouvrier e Ouvrières chez Bidermann: une histoire, des vies.